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A cor azul dos miosótis

Somos mais produto do meio que nos constrói ou da imaginação que nos concebe?

A minha mãe a pintar

18.04.09 | Jorge Almeida

Manhã cedo, levanta o centro da sala de jantar, pousa a tela, e ali fica, embrulhada no silêncio, pela manhã fora, a entreter as horas felizes com que ocupa o tempo. Tem 81 anos, nascida em Amarante, e uma vida igual à de tanta gente que, como ela, vive sozinha. Viúva há 28 anos, com os filhos casados, descobriu há pouco tempo o prazer de pintar. E agora é a sua paixão. Foi por Deus – diz. Não saberia como ocupar o tempo. Fez outras coisas. Costurou, bordou, teve outras actividades durante a vida. Agora encheu-se, já não tem paciência. Agora do que gosta mesmo de fazer é pintar. Precisa de estar Sol. Só pinta de manhã. Podendo, todos os dias. Precisa de luz. A vista também já está cansada. Às vezes até se esquece de fazer o almoço. Quando vai a ver, as horas que já são. O resto do tempo vê televisão. E faz a lida de casa. Pintar é o seu hobby. E tem muito prazer nisso. É feliz. E sente-se orgulhosa. Este quadro foi o neto, de 16 anos, que o desenhou. Tem jeito. É talentoso. Mas foi o quadro que a fez mais “sofrer”. Várias vezes, quando os filhos lhe ligavam, manifestava a sua frustração. Como se a luz da manhã se tingisse de sombras e a alegria da realização se esmorecesse. Depois, como um sonho que lentamente se vai realizando, assim o quadro se completou como obra realizada.

 

Este texto foi apresentado no catálogo de uma exposição onde a minha mãe expôs um quadro.

 

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